Corona Vírus, COVID-19 e a Mobilidade Elétrica

Vivemos tempos muito diferentes do que era a chamada “normalidade”.


Henrique Sánchez
Presidente do Conselho Diretivo da UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos
Artigo Mensal de Opinião na Revista Blueauto


De repente, toda a Humanidade é fortemente sacudida por um vírus que salta do reino animal para a espécie humana, um vírus desconhecido para o qual nenhum de nós possuía anticorpos, infetando mais de 250.000 pessoas e provocando a morte a mais de 10.000 pessoas (artigo escrito no dia 20 de março).

Têm sido instaurados um pouco por todo o mundo estados de exceção ou de emergência que obrigam a dezenas/centenas de milhões de pessoas a ficarem recolhidas nas suas casas em isolamento profilático e social para impedir o contágio. Algo nunca visto na História da Humanidade.

E o que é que isto tem a ver com a mobilidade elétrica?

Vamos por partes. Todos aqueles que podem carregar o seu veículo elétrico nas suas casas – carro, mota ou bicicleta – estão menos expostos a um possível contágio, ao contrário daqueles que obrigatoriamente têm que abastecer o seu carro numa Estação de Serviço ou numa Área de Serviço, estando assim mais expostos a um possível contágio.

Carregamento de um veículo elétrico em casa, evita o contágio.


Com o confinamento das pessoas nas suas casas e as restrições às deslocações não essenciais para o abastecimento de alimentos, medicamentos, de trabalhadores de serviços de saúde, limpeza, segurança, ou outros que exigem a presença física do trabalhador, verificou-se uma redução muito significativa do tráfego, quer de automóveis particulares, quer de transportes públicos, quer de voos comerciais, reduzindo muito significativamente as emissões de CO2 e dos restantes gases tóxicos que os motores de explosão interna, sejam eles a gasolina ou a gasóleo emitem. Com a diminuição do tráfego, reduziu-se o ruído produzido por esses mesmos veículos, assim como diminuíram os engarrafamentos e o tráfego tornou-se muito mais fluído, chegando a desaparecer completamente.

A AIE – Agência Internacional de Energia divulgou um relatório em que a procura global de petróleo deve contrair-se este ano pela primeira vez desde 2009, estando a serem emitidos menos 1.000.000 de toneladas de CO2 por dia no planeta, desde o início dos confinamentos e das restrições de circulação.

Muitas empresas adotaram o teletrabalho para aquelas funções que o permitiam, contribuindo para que centenas/milhares de trabalhadores passassem a cumprir as suas tarefas profissionais a partir de suas casas, evitando assim provocar mais trânsito, mas, também evitando a perda de horas de viagem nas suas deslocações diárias casa-trabalho-casa, tempo que muitos descobriram que podia ser aproveitado para estar com os seus filhos, ou ler um livro, ou ver um filme, ou arrumar as “tralhas” que todos vamos acumulando.

New York, antes e depois do estado de emergência.


Paris, antes e depois da chegada do COVID-19.


Em resumo, passámos a ter mais tempo, deixámos de ser focos de poluição, pois a maioria ainda utiliza veículos poluidores, e em troca, passámos a ter tempo para nós, para as nossas famílias, para amigos e vizinhos, nem que seja através do contacto online.

Em certas regiões do globo, ao princípio na província de Hubei, na China, e mais tarde na Lombardia, no norte de Itália, verificou-se uma redução muito significativa da poluição atmosférica, chegando a uma redução de 25% da quantidade de CO2 emitido em pouco mais de um mês. Este abrandamento da atividade humana, quer nas deslocações das pessoas utilizando transportes, particulares ou coletivos com motores de combustão interna muito poluentes, quer na paragem de atividade de inúmeras fábricas, quer com a suspensão dos voos comerciais, ou com a significativa redução dos navios de cruzeiro, permitiu à natureza voltar a respirar um pouco.

Algumas espécies animais aventuraram-se em territórios desconhecidos para eles, as cidades ou os canais de Veneza, recuperam de níveis de poluição extremos. Por diferentes razões, algumas cidades vão sendo invadidas por animais selvagens, fruto da redução da atividade humana e industrial e da redução da poluição atmosférica e sonora, resultado desse mesmo abrandamento.

Os peixes voltaram e as águas estão límpidas.


Em Veneza, as águas dos seus canais, agora mais límpidas, menos poluídas, embora a principal razão da sua limpeza seja que, sem tráfego dos barcos, a poluição deposita-se no fundo dos canais, e sem o barulho de centenas/milhares de barcos a motor, fez aparecer nas suas águas milhares de peixes, que se aventuram de novo pelos canais de Veneza.

Na Tailândia, com a redução dos turistas que alimentavam os macacos, estes entraram na cidade de Lopburi, esfomeados, à procura de comida, lutando entre eles por essa mesma comida.

No Japão, pelas mesmas razões, veados vêm à cidade à procura de comida, aventurando-se assim em terrenos desconhecidos, procurando a comida que os turistas lhes forneciam nas visitas ao Parque Nara.

Em suma, a natureza rapidamente ocupa os lugares libertados pelos humanos, neste caso diversas espécies animais.

Esta espécie de grito de socorro da natureza, completamente submergida pela crescente atividade humana, pela delapidação de recursos, pelas altas taxas de poluição atmosférica e sonora nas grandes urbes metropolitanas, deve fazer-nos refletir sobre o modelo de desenvolvimento em vigor e sobre o tipo de organização social e económica que pretendemos.

Vamos dar uma oportunidade à nossa casa Mãe, o planeta Terra, e aceitemos esta epidemia/pandemia como uma chamada de atenção, um grito de alerta, para o que podemos mudar, para aquilo que apenas depende de nós, de cada um de nós.

Mais teletrabalho, mais videoconferências, menos congestionamento de trânsito, menos viagens de avião, especialmente as que podem ser substituídas por meios ferroviários ou rodoviários elétricos.

Rejeitar o consumo de combustíveis fósseis, adotar nas nossas deslocações, quer particulares quer coletivas, quer privadas quer públicas, veículos elétricos.

Vamos pensar e refletir no que podemos mudar. Não queremos voltar à “normalidade”, vamos lutar por uma nova normalidade, mais humana, menos agressiva da natureza, mais solidária, menos individualista, transformemos o que é uma provação da nossa liberdade, num momento de reflexão conjunta, com a família, com os amigos e com os vizinhos, sobre o que cada um de nós pode efetivamente fazer para mudarmos para melhor, consumir menos, não poluir, conviver mais com os nossos filhos e pais.

Quando este período de provação e de sacrifícios passar, vai ser doloroso, arregacemos as mangas para ajudarmos, todos, a construir uma sociedade mais justa e solidária, os nossos filhos e netos agradecerão.

Para que este período seja o mais curto possível, isolamento profilático e social, o mínimo contacto exterior, é imperativo e obrigatório, ajudemos os nossos profissionais de saúde a ajudarem-nos, temos que parar o contágio e abrandar o ritmo de expansão do coronavírus.

Por todos nós, não temos tempo, fiquemos em casa!


A versão digital do nº 30 da revista Blueauto, de abril de 2020, será distribuída gratuitamente a todos os Associados UVE com a quota de 2020 ativa, na sequência da parceria estabelecida entre a UVE e a Blueauto.