A revista Eurotransporte n.º 115 encontra-se disponível em suporte digital, gratuitamente. A UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos mereceu especial destaque, no Suplemento+ dedicado a Furgões Elétricos, com uma entrevista ao Presidente da UVE, Henrique Sánchez.
Desde a sua fundação (6 de dezembro de 2015), a UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos, tornou-se uma entidade de referência para os utilizadores de veículos eletrificados e para os entusiastas da Mobilidade Elétrica em Portugal. Henrique Sánchez, natural de Lisboa, é presidente da associação e fundador desta associação que tem como missão promover a mobilidade elétrica e dar voz a uma já significativa comunidade de proprietários, utilizadores, simpatizantes de veículos elétricos (VE) e híbridos plug-in.
Henrique Sánchez
Henrique Sánchez é um dos Associados Fundadores e um dos dirigentes da UVE – Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos.
EUROTRANSPORTE – A UVE referiu recentemente que já se venderam mais de sete mil automóveis elétricos. Ou seja, mais de 70% acima das unidades vendidas, por exemplo em 2018. Os veículos elétricos vieram mesmo para ficar?
HENRIQUE SÁNCHEZ – Sim, já não temos dúvidas de que os veículos elétricos não são uma simples moda passageira. Vieram para ficar porque são mais económicos e eficientes, com prestações superiores aos veículos com motores de combustão interna equivalentes, mais desenvolvidos tecnologicamente, sendo apenas ainda ligeiramente mais caros que os equivalentes com motores térmicos.
Em 2009, o projeto-piloto da rede Mobi.E – Rede Nacional de Mobilidade Elétrica, que consistia na instalação de 1300 postos de carregamento, dos quais 50 de carga rápida, em 25 municípios, colocava o país na linha da frente da mobilidade elétrica na Europa. Este projeto foi cumprido?
Ainda não. Como sabemos o Projeto Piloto da Mobi.E foi interrompido em 2012, com a suspensão da instalação da rede Mobi.E e o cancelamento dos incentivos à aquisição de veículos elétricos por parte do Estado. Ficaram por instalar 49 dos 50 Postos de Carregamento Rápido (PCR) que estavam previstos, tendo todos os outros, Postos de Carregamento Normal (PCN) sido abandonados na sua manutenção. A rede pública da Mobi.E recomeçou a ser instalada a partir de agosto de 2016, com a abertura do corredor de carregamento rápido na A2, para o Algarve.
Mas continuamos nessa linha da frente?
Sim e não. Esta interrupção do projeto, entre 2012 e 2016, penalizou muito a rede pública da Mobi.E e criou desconfiança nos utilizadores e também na aquisição por parte dos particulares e empresas de veículos elétricos. Ou seja, quer pela suspensão dos incentivos à aquisição, quer pela mensagem de incerteza e desconfiança, que representa esta flutuação nas políticas de incentivo, nomeadamente fiscais, gerou-se alguma incerteza. Portugal, com a quota de mercado de 5,7%, é hoje o quarto país na União Europeia em vendas de veículos elétricos, incluíndo os 100% elétricos (BEV – Battery Electric Vehicle) e os híbridos plug-in (PHEV – Plug in Hybrid Electric Vehicle), estando à frente a Holanda (16,3%), a Suécia (11,3%) e a Finlândia (6,9%). Ora isto quer dizer que já merecíamos ter uma rede pública de mobilidade elétrica melhor servida.
Qual a sua opinião quanto aos veículos elétricos ligeiros de transporte de mercadorias, habitualmente chamados de furgões?
Os veículos elétricos de transporte de mercadorias, vulgarmente chamados de furgões, normalmente utilizados para distribuição nas grandes áreas metropolitanas, são fundamentais para a eletrificação dos transportes em meio urbano e para o combate aos níveis de poluição nas grandes cidades em áreas metropolitanas. Em Portugal temos o exemplo da Fuso e-Canter 100% elétrica, produzida no Tramagal, e que tem diversos exemplares em teste em cidades por todo o mundo, desde Londres, Berlim, Tóquio, Nova Iorque ou Lisboa, entre outras.
Até que ponto deveria ser apenas permitido a circulação desta categoria de veículos na distribuição nas cidades?
Será o futuro, e cada vez mais um futuro mais perto, assim que as marcas disponibilizem modelos que se adaptem às necessidades das empresas. Para este tipo de atuação, a autonomia não é relevante pois os percursos são perfeitamente compatíveis com o atual grau de desenvolvimento destes veículos. Várias frotas de empresas de distribuição já estão eletrificadas um pouco por todo o mundo e também em Portugal.
Acha que Portugal está no caminho certo, quanto à utilização de veículos eletrificados na distribuição, ou ainda há muito trabalho a fazer, nomeadamente junto das empresas de distribuição?
Existe ainda muito trabalho a fazer no campo da informação da oferta atualmente disponível, da sua fiabilidade, eficiência e economia, mas também no aumento da oferta por parte dos diferentes fabricantes que ainda não disponibilizam uma gama variada: veículos de limpeza urbana, veículos com câmara frigorífica, de caixa aberta, etc.
A estratégia adoptada pelos fabricantes na concepção de veículos ligeiros de mercadorias é uma aposta ganha?
Sim, temos visto que a procura é crescente, quer por parte de autarquias, Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia, mas também por frotas de distribuição de encomendas e abastecimento de lojas, mercados, pequenos supermercados e mercearias de bairro. Digamos que no caso da região de Lisboa fariam a distribuição de o MARL, para os pequenos retalhistas.
Na perspectiva da UVE o mercado tem resposta relativamente a modelos de veículos elétricos para este sector?
Tem alguma resposta, mais ainda com preços elevados. No entanto ainda é uma resposta insuficiente, apesar de ser uma oferta em constante crescimento, urge mais modelos e a preços mais reduzidos.
E quanto a veículos pesados de mercadorias, vulgo camiões, qual a opinião da UVE sobre estes?
Os grandes veículos pesados de mercadorias exigem uma autonomia muito maior, não existindo ainda no mercado oferta para este segmento de mercado. Existe bastante expectativas face ao lançamento do Semi, o camião que a Tesla promete vir a revolucionar o transporte rodoviário pesado elétrico.
A autonomia deste tipo de veículos, sejam particulares ou comerciais, é um factor importante, aquando a sua compra. No seu entender os fabricantes estão a evoluir no sentido de dotar cada vez mais os modelos de autonomia?
No que diz respeito aos veículos ligeiros de passageiros e comerciais a oferta atual já contempla veículos com uma autonomia suficiente, no caso dos ligeiros de passageiros temos autonomias à volta dos 300 km existindo modelos com autonomias de 500 km a 600 km. No caso dos ligeiros comerciais as autonomias atuais situam-se entre os 200 km e 300 km. No que se refere aos veículos pesados de passageiros para frotas em meio urbano já existe oferta com autonomias entre os 200 km e os 250 km, e vários exemplares a operarem em frotas de transportes urbanos de passageiros em algumas localidades de Portugal.
Os veículos pesados de mercadorias são o setor onde ainda existe uma clara falta de oferta, por força da ainda incipiente autonomia para as viagens longas.
9 QUESTÕES SOBRE MOBILIDADE
1 – Qual o tempo de duração normal de uma bateria?
Uma bateria de um veículo elétrico pode durar até mais de 30 anos, antes de ser reciclada. Esta longevidade é dividida em duas fases: inicialmente serve para alimentar o motor de um veículo elétrico, onde sofre o seu maior desgaste e pode durar entre 10 a 15 anos, (mantendo a rentabilidade necessária para o veículo);
Após servir o seu propósito principal, as baterias podem ser reaproveitadas como unidades estacionárias de armazenamento de energia. Depois de passar por estas duas fases, as baterias de iões de lítio podem ser recicladas, sendo reaproveitada cerca de 95% da matéria-prima.
2 – Portugal está bem servido de postos de carregamento fora de casa?
Sim, faltando ainda alguma capilaridade. Desde o início de 2020 que verificamos diariamente, a instalação de novos postos de carregamento públicos e privados. Atualmente são 142 PCR (Postos de Carregamento Rápido) a funcionar e mais 800 PCN (Postos de Carregamento Normal) a funcionar em todo o território. Adicionalmente verificamos que frotas de veículos elétricos começaram a criar as suas próprias estruturas para carregamento dos veículos, libertando assim a rede de carregamento pública para os restantes utilizadores.
3 – Os preços dos veículos elétricos são um entrave à sua aquisição?
Não necessariamente. Atualmente existem veículos 100% elétricos desde os 21.000 euros. Contudo, o preço deixa de ser um entrave, quando a ele juntamos todas as vantagens e poupanças futuras ao ter um veículo elétrico.
4 – Os incentivos à compra de veículos elétricos são suficientes e atrativos para o consumidor?
Sim, no entanto, no que se refere aos particulares são manifestamente insuficientes, se compararmos com o nível médio dos incentivos praticados na União Europeia. Adicionalmente aos incentivos do Estado à aquisição de um veículo elétrico, algumas marcas apresentam descontos para os modelos 100% elétricos.
5 – É da opinião de que ainda falta muito caminho a percorrer rumo à eletrificação massiva do mercado?
Desde meados de 2019 que foram várias as marcas automóveis (que não tinham modelos eletrificados para venda) a optarem por eletrificar modelos já existentes, ou criar modelos novos, 100% elétricos. Desde o início de 2020, a grande maioria dos fabricantes de automóveis ligeiros dispõe de vários modelos eletrificados.
6 – Quando adquiriu o seu primeiro veículo elétrivo?
Em 2011.
7 – Os veículos elétricos são o futuro?
Sem dúvida que sim, eu diria que para muitos condutores são já o presente.
8 – Que conselhos daria às empresas que pretendem adquirir veículos elétricos para a sua atividade de distribuição de mercadorias?
É a opção mais lógica, principalmente dentro das grandes cidades. Uma das novidades no Programa de Incentivos de Aquisição de Veículos de Emissões Reduzidas do Fundo Ambiental em 2020, são os veículos ligeiros de mercadorias 100% elétricos, que passam a estar incluídos na concessão dos incentivos.
9 – Que palavras gostaria de transmitir ao consumidor particular que vai comprar um automóvel?
Não espere mais. Experimente conduzir um veículo elétrico. Os benefícios, sejam financeiros ou ambientais, estão mais que comprovados e documentados. Opte ou mude para um veículo elétrico, o seu bolso e o ambiente agradecerão.
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